Neste sábado, eu vou para o Rio de Janeiro. A boa desculpa é que tenho um congresso, e ainda que ele só comece na segunda feira, chego antes. Usei a mesma desculpa da primeira vez em que estive lá. Gostei de conhecer o Rio e até tenho dois lugares preferidos.
O primeiro é a Praia Vermelha. A Praia Vermelha é uma prainha. Toda a simpatia que eu tive por ela na época teve a ver com a forma como eu me sentia. Não foram dias fáceis. Algumas pessoas, quando precisam começar de novo vão para Paris. Pode reparar a quantidade de filmes em que as pessoas escolhem Paris como o destino para se esquecerem de uma dor de cotovelo. Na época eu não tinha cacife pra isso e continuo não tendo. Mas na época, eu precisava mesmo viajar um pouco, conhecer algumas pessoas diferentes, lugares que nunca estive, enfim, sabe aquela coisa de começar a contar uma história em que, de maneira alguma, vai aparecer um determinado personagem?
Pois é. Deve ser por isso que a gente viaja. Aquelas ruas não vão ser familiares, não vão ter histórias, diálogos e discussões bobas. Claro, ninguém está imune do risco de, mesmo em uma cidade nova, deparar-se com situações que parecem próximas. A gente insiste em se lembrar que alguém gostaria de conhecer aquele lugar, ou que odiaria aquele restaurante e assim por diante. Sinal de que, no fim, não há mesmo jeito de se viajar sozinho.
O meu segundo lugar preferido no Rio de Janeiro é o cemitério São João Batista. Sim, eu sou esse tanto estranha. Eu gosto de cemitérios. Aliás, se alguma vez você já caminhou por um cemitério, percorrendo túmulos, datas e epitáfios, você também deve ter se interessado por tantas histórias que se encontram enterradas. Tenho um gosto por elas, as histórias enterradas. Como ninguém vai confirmar se as que passam pela minha cabeça são as verdadeiras histórias, fico com as da minha imaginação. E, sinceramente, eu nem gostaria que ninguém as confirmasse. Minha veia dramática tem uma tendência a melhorar coisas que são por natureza mais entediantes.
Nessa primeira visita ao cemitério, junto com minha amiga querida, encontrei o túmulo de uma menina. Nele, eram muitas as velas, as flores, as plaquinhas de agradecimento. Uma criança morre e as pessoas começam a atribuir milagres a ela. Então, as pessoas faziam pedidos àquela menina. Eu fiz o meu. Já faz cinco anos desde essa viagem, e lembro bem do pedido que eu fiz. A minha amiga que estava comigo não se lembra do dela.
Mas eu compreendo bem porque eu lembro. Pelo mesmo motivo que me pareceu bonita a Praia Vermelha em um dia muito frio, cinza, chuvoso e com um vento forte demais. Se eu olhei para aquela praia, tão pequena em sua própria imensidão, é porque não foram aquelas águas turbulentas que refletiram nos meus olhos. Fui em que me vi refletida naquela fúria, naquilo tudo que só me parecia tristeza. Dificilmente a gente esquece do que pensou e das orações que fez quando esteve muito triste. A tristeza ajoelha o mais cético, a quem só resta fazer um pedido a um túmulo de uma criança que morreu cedo demais. E esperar.