
Continuo lendo Freud como se não houvesse amanhã e continuo fazendo chaves ao lado de alguns parágrafos e escrevendo ao lado "bonito". Sem grandes reflexões, sem brilhantes conclusões e digressões minhas que seriam muito insignificantes. Na última vez que eu escrevi aqui, escolhi duas dessas frases bonitas, mas só porque elas me fizeram pensar em algumas coisas. De resto acho bem chato ficar fazendo isso o tempo todo. Sei lá, ler pessoas que escrevem brilhantemente e mostrar a minha sagacidade em escolher frases de efeito, sobre as quais nada tenho a dizer e nem me fizeram pensar. Acho pedante.
Enfim, escrevi isso porque, pensando muito rápido sobre a minha vida, fiquei com a impressão que sempre andei pelos caminhos mais tortos antes de chegar nos objetivos. E já contei vários desses meus trechos do que sou eu errando pela vida. Mas acho que nunca comentei que quando conheci Freud não fui com a cara dele. Continuo culpando um texto que NUNCA deveria ser apresentado pra gente de segundo ano de Psicologia. Tem tanto texto bacana que ele escreveu para apresentar a psicanálise e uma professora resolve começar pelos espinhentos, cheios de notas de rodapé freudianas (muitas e longas). Ela não deveria saber que, antes de descascar o abacaxi, a gente tem que gostar de abacaxi? Deveria saber.
Mas enfim, o que aconteceu algumas pessoas bem íntimas sabem e continuam me amando, aceitando ainda assim. Depois de ter ficado bem decepcionada com a psicanálise, o próximo autor da lista da professora era o Reich. E por mais difícil que seja dizer em voz alta, sim, eu curti Reich. E eu fui em congresso de psicoterapia corporal E achei legal. Quer dizer, eu achei legal só até eu ter me inscrito numa coisa do congresso que chamava "vivência". Havia conferências, mini-cursos, mesas-redondas e vivências. Não lembro direito, mas devo ter achado o nome bonito e fui.
E quando cheguei na tal vivência, de fato vivenciei a coisa que mais odeio, mas que alguns acham superbacana, interativo, interessante e sei lá mais o que, que é colocar pessoas que não se conhecem, nunca se viram na vida, em situações de constrangimento. O termo vivência deveria ter servido de alerta, mas esperteza nunca foi meu forte. Enfim, eu me vi numa sala toda encarpetada com mais, sei lá, vinte pessoas. Nos mandaram tirar o sapato (por quê, meu deus, por quê?) e imitar gorilas, fazendo pares e fazendo de conta que catava piolhos na cabeça um do outro. Isso foi tão, mas tão traumatizante/humilhante, que só consigo lembrar de alguns flashes, de que a coisa toda durou mais tempo e que houve outros constrangimentos sem os quais eu poderia ter passado o resto da minha vida.
E logicamente, eu não lembro o que foi dito, mas lembro que não saí por medo que pudessem falar mal de mim. TIPO, como uma pessoa encouraçada dessas resolve curtir psicoterapia corporal. E como uma pessoa que se sente desconfortável com beijos e abraços gratuitos e aleatórios e que não sabe e nem nunca soube se expressar fisicamente (nulidade nos esportes tá aí que me deixa mentir) acha que seria uma ideia bacana a abordagem. Nem vou falar dela aqui porque posso falar (mais) besteira.
Bom, depois disso, por uma felicidade do destino, li um texto muito maravilhoso de Freud que não parecia mais um compensando de conceitos que eu não entendia e que, pelo contrário, dizia sobre coisas que faziam parte da minha vida. Me rendi. Quando resolvi fazer mestrado, sempre tomando o caminho mais espinhento, demorei para entender o que eu queria pesquisar e por quê. E aí (olha como a psicanálise é bonita), eu chego a conclusão que o que eu mais gosto dela tava naquele texto, sobre o qual muitos xiitas falam mal, e em muitos outros que eu leio, leio e leio e não me canso, porque eles me mostram, em primeiro lugar, que a minha pergunta é superpertinente à psicanálise, à prática dela e ao que dizem sobre ela. Em segundo, porque eu percebo que me pergunto isso desde que, aos dezenove anos, quando fiquei sabendo que ela existia. Mas tudo isso hoje é óbvio, porque é assim mesmo que a psicanálise funciona.