Quando estou sozinha em algum lugar eu penso mais. Toda segunda feira, quando meu ônibus percorre a Avenida Angélica, fico olhando admirada para os sobrados e palacetes que resistiram ao tempo e torço para não ver a placa de nenhuma empresa privada, mostrando que as pessoas que moraram ali um dia não existem mais, ou desistiram. Alguém vendeu as casas que contam histórias.
Mesmo quando essas casas parecem decadentes, se percebo que ali mora gente, dá um alívio. Ontem em meio a dois prédios gigantes, bem próximo da Praça Buenos Aires, vi uma senhorinha na varanda. A casa precisaria de uma reforma, uma pintura, uma revigorada, mas ainda assim, tem mais graça que as restauradas por bancos e cuidadas por empresas terceirizadas. A minha curiosidade é entrar e ver o que restou das famílias, enfim, até onde a decadência chegou do lado de dentro.
Tenho a mesma curiosidade em relação às pessoas enterradas em cemitérios. Meu ônibus passa também em frente ao Cemitério da Consolação e da Necrópole São Paulo (sempre gostei da palavra necrópole). Toda vez eu penso que preciso descer por ali algum dia e dar uma volta nos cemitérios, olhar os túmulos, fazer as contas de quantos anos as pessoas tinham quando morreram, e tentar forjar as histórias delas na minha cabecinha. É besteira, mas eu faço isso desde pequena (quando vim morar perto de um cemitério).
Em frente à Necrópole São Paulo existem várias lojas de antiguidade. Minha irmã diz que cada cadeira dessas vem com uns dez fantasmas em cima. Mas eu gosto, quero mais é que os fantasmas e as histórias deles venham pra minha casa. Ainda não posso montar a minha casa, mas quando eu puder, quero coisas antigas fazendo contraponto com as novas. Não quero que essas coisas se percam, essas que um dia foram novas, modernas, chiques e que tiveram um valor para alguém, que presenciaram cenas, como se esses objetivos tivessem sentimentos, é estranho pensar nisso, mas eu penso.