sexta-feira, 9 de outubro de 2009
Sobre o passado
Nada passa, nunca; tudo o que acontece é indelével. Acrescento: sobretudo os amores, por mais que acabem, continuam vivendo, subterrâneos, dentro de nós, porque, bem ou mal, são essas as vivências que mais nos formaram e transformaram. (Contardo Calligaris)
Quando sofremos abusamos da transitoriedade das coisas, dizemos que isso vai passar, questão de tempo. E um dia passa sim, pelo menos a dor, a angústia, o aperto no coração que sentíamos com aquela situação. A primeira vez que a gente sofre conscientemente é tão, mas tão arrasador que pensamos que é impossível, que não vai dar pra aguentar.
O que não passa é a marca que fica das passagens que nos arrancam da posição confortável e nos fazem deparar com nossos erros, os erros alheios, com as nossas faltas, com o nosso gozo pelo sofrimento. Quando um amor começa temos a ideia que ele é perfeito em toda a sua composição, perfeito como uma partitura, fruto do nosso narcisismo, não há nenhum amor melhor. Quando o amor termina procuramos em cada canto escuro da memória onde que o erro aconteceu, quem foi o culpado, quem foi inocente, onde se perdeu o que era tão bacana.
É tão difícil conviver com a culpa pelo fim de algo que era caro que arde, incomoda, é uma daquelas feridas que não cicatrizam, é a própria falta da possibilidade de deixar pra trás, seguir em frente, elaborar. Freud falava em recordar, repetir e elaborar e no quanto repetimos escolhas, amores, formas de agir até que a elaboração seja possível. Repetimos sempre, mas nem sempre isso é ruim. A repetição é também uma forma de se corrigir e de tentar novamente. Mas quando ela nos leva a novos abismos - ou a velhos - é tão perigoso que juro que me dá medo.
O que eu aprendi nos últimos anos, pelas vivências me me formaram e transformaram, foi entender o quanto somos livres diante das muitas situações que porventura ainda nos afligem. Livre para permanecermos agarrados a elas ou para voarmos pelo mundo, procurando novos meios, outros caminhos. Poder pensar sobre essas coisas me permitiu voltar a encontrar o amor, na mesma pessoa (mas de uma forma totalmente diferente). Eu queria sim poder tirar os sofrimentos e as angústias das pessoas que gosto com a mão. Mas eu não posso. Eu posso escutar, e isso continuo fazendo.
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