Recordar, repetir e elaborar. Para Freud é assim que nós vivemos nossas vidas e eu não poderia concordar mais. Relendo meus antigos textos, me deparei com um que fala muito sobre o que eu venho sentido nos últimos dias. E decidi editá-lo, e colocá-lo aqui.
Nos períodos mais difíceis da minha vida rascunhar frases - mesmo que não sejam lidas por ninguém - me reconforta [...]: pela linguagem supero meu caso particular, comungo com toda a humanidade. É na minha opinião uma das tarefas essenciais da literatura, e que a torna insubstituível: superar essa solidão que nos é comum a todos e que apesar disso, nos torna estranhos uns aos olhos dos outros(Simone de Beauvoir - Uma morte muito suave).
Ela escreveu esse livro depois da morte da mãe. Outro dia eu disse que existem dores miseravelmente pequenas se comparadas a outras.
Mas esqueci de dizer que acho errado subestimar as próprias dores. Na verdade, é errado subestimar as nossas experiências e acreditar que o que acontece conosco não é nada perto do que acontece com os outros. Olhando de fora, a vida alheia é mais interessante, mais cheia de romance, comédia e ação. E é difícil parar pra pensar e procurar essas três coisas na própria vida.
Minha vida se transformou em uma novela que parecia não ter fim. Mas só quem pode terminar com uma novela, enredo, roteiro, é aquela pessoa que está escrevendo, certo? E quem senão nós somos responsáveis pelas coisas que acontecem com a gente? Quem tem o poder de concluir coisas ou de dar a sensação de inacabamento a elas?
Somos nós quem deixamos portas, janelas, frestas abertas para um reinício. Pode até ser que o colorido mude um pouco, mas no fim, salvo raras exceções, quando na vida perde-se a magia do primeiro encontro, do primeiro beijo, do primeiro momento especial, do primeiro "eu te amo" - precipitado ou não - a continuação sempre soa esquisita e só de muito longe lembra a felicidade daqueles dias que passaram e nos quais a gente se apóia cegamente, lembrando como foram bons.
A gente briga contra o tempo e faz um pedacinho da vida ficar parado.
Os dias passam bem rápido. "Precipitam-se tragicamente", citando mais uma vez Simone de Beauvoir, que é hoje a minha autora predileta. E é tão difícil não saber o que vai acontecer...Quando a gente tem alguém ao lado, acreditar que aquela companhia não vai embora reconforta, é doce, é indescritível. Mas pode ser que vá.
É preciso deixar que as coisas aconteçam. E para pessoas ansiosas como eu, esperar pode ser uma tortura ainda maior do que a dor dos tombos sem fim.
Eu disse que estava infeliz, mas não estou, não. É claro que eu tenho meus momentos de melancolia, mas se alguém não tiver, por favor, eu preciso dessa receita. Na maior parte do dia eu faço coisas por mim, mas por mais que eu aprecie muito meus momentos de solidão, eu gosto mesmo é das pessoas por perto.