"subst f anestesia [ɐnəʃtə'ziɐ] tratamento para suprimir a sensibilidade"
A associação imediata que eu faço com a palavra anestesia é dor. Durante muito tempo, quando ia ao dentista, não recebia anestesia. Mesmo para tratar cárie. Quando eu tinha 17 anos, precisei tratar uma e fui em outra dentista. Fiquei muito admirada que ela aplicou uma anestesia para retirar a cárie.
Eu pensava que as anestesias serviam para tirar cisos, fazer tratamentos de canal, extração de dentes, enfim. Por outro lado, achei bem bacana a situação de ficar com a boca adormecida e não sentir nem a pressão que faz aquela maquininha do dentista.
O mais engraçado é que eu era uma criança pequena e não lembro de sentir dor. A dentista falava pra mim "Se doer, você me avisa". A dentista atual fala "Pra evitar a possibilidade de dor, vamos anestesiar". Eu conto essa história porque hoje, na vida, normal é anestesiar.
A vida é sofrida e isso é fato. Mas me constrange a dificuldade que é encarar esse sofrimento. Há uma verdadeira inconformidade das pessoas diante da dor de viver. Ansiedade, insônia, depressão, as famosas (e mal denomidadas) crises de pânico (um pouco demodé), transtorno de personalidade bipolar (esse tá bombando). Existe anestesia pra isso.
Lacan chama de covardia moral o recuo do sujeito diante do seu desejo. Mas isso não é um julgamento. É fato que acontece o tempo todo e com todos. Encarar a liberdade pelo próprio desejo o tempo todo seria ideal. E o que é ideal fica só no mundo das idéias mesmo. A verdade é que todo mundo vez ou outra recua diante da vida, recua diante do próprio desejo. E se eu me anestesio, eu recuo diante de todos eles. Isso é supressão da sensibilidade, conforme a definição do termo. Que no caso das anestesias para as dores da alma, suprimem a personalidade mesmo.