Desde que comecei minha vida de migrante (em abril) comecei a perceber coisas que antes eu não percebia. Provavelmente por ficar durante muitas horas parada em rodoviárias, ônibus, trens e metrôs. Noto as pessoas, o jeito delas, se estão felizes ou tristes e tento imaginar porquê. É quase como um passatempo.
Toda semana em São Paulo eu saio da USP para pegar a van que me leva até a Vila Madalena onde eu tenho terapia. Todos os dias depois da terapia antes de pegar o metrô, eu compro milho verde (gosto de viver grandes aventuras). Eu fico imaginando o que o cara que vende milho verde pensa dessa menina que toda santa quarta feira compra um potinho de milho verde com cara de quem acabou de ter uma crise de choro. E é exatamente o que acontece todas as semanas. Acho que é uma fase normal da terapia. Eu chorava muito quando comecei, e agora que tive que trocar de psicóloga, choro de novo.
Não bastasse o cara do milho verde, todo mundo no metrô fica me encarando. E eu não sei o que é pior: usar óculos escuros no metrô às 18h ou ficar com cara de choro. Mas sinceramente, desencanei. Nem ligo. Podem imaginar o que eu quiser, até porque, eu também imagino.
Essa semana, atravessando a rua de todas as semanas, passa por mim um carro. Um escort conversível. Quando eu era criança esse era um carro muito chique e muito bacana. O tempo estava bem nublado e a marginal era a Pinheiros, e o rio Pinheiros ao lado estava exalando seu odor peculiar. Quando o tempo fica para chuva em São Paulo, o cheiro fica insuportável. Mesmo assim, aquele escort estava com a capota abaixada. Quem dirigia era um senhor de uns sessenta e poucos anos, cabelos branquinhos, branquinhos. Junto com ele duas senhoras, também com os cabelos brancos, óculos escuros. Só faltou o lenço!
Hoje, no meu aniversário, eu desejo que quando eu tiver com sessenta ou mais, eu também possa passear de boa por uma das marginais mais movimentadas de São Paulo, ou de qualquer lugar do mundo, em um carro conversível, com a capota abaixada em uma quarta feira nublada.